Histórias de Jequié, Lomanto e Getúlio

Sebastião Nery (*)

by Antonio Gabriel Nássara, desenhista carioca

by Antonio Gabriel Nássara, desenhista carioca

Pálido, os olhos tristes e a alma cansada, Getúlio Vargas desceu em Belo Horizonte, na tarde de 12 de agosto de 1954, a convite do solidário governador Juscelino Kubitschek, para inaugurar a siderúrgica Mannesmann. O Rio pegava fogo com o inquérito da Aeronáutica (a “Republica do Galeão”) contra os que tinham tentado matar Lacerda.

Liderados pelos comunistas e udenistas, nós estudantes, com lenços amarrados na boca, impedimos que Vargas atravessasse a cidade pela Avenida Afonso Pena, sendo o cortejo presidencial obrigado a seguir pela Avenida Paraná e tomar a Avenida Amazonas até a Cidade Industrial.

No palanque, ao lado do governador e dos colegas jornalistas, vi bem suas mãos trêmulas mas a voz forte. Vargas deu seu recado aos inimigos:

– Advirto aos eternos fomentadores da provocação e da desordem que saberei resistir a todas e quaisquer tentativas de perturbação da paz.

Da inauguração, Getúlio foi direto para o Palácio das Mangabeiras. Não conseguiu dormir, segundo confessou depois a Juscelino. Depois do café da manhã, antes de voltar para o Rio, de pé, sorrindo discretamente, com seu indefectível charuto, ao lado de JK, Getúlio nos cumprimentou, um a um, e disse algumas palavras aos poucos jornalistas ali presentes.

Eu era o mais novo, fiquei na ponta. Achei sua mão gordinha e fria:

by William Jeovah de Medeiros, desenhista paraibano

by William Jeovah de Medeiros, desenhista paraibano

– É muito jovem. De que Estado você é?

– Da Bahia, presidente. De Jaguaquara.

– Onde fica?

– Entre Salvador e Ilhéus, perto de Jequié.

Ele parou, pensou um pouco:

– Jequié, Jequié. Conheci o jovem prefeito de lá. Conversamos, me deixou uma boa impressão. É um rapaz de futuro.

– É o Lomanto, presidente.

– Pois é, um rapaz de futuro.

Despediu-se com seu discreto e distante sorriso e a mão gordinha e fria.

(*) Excertos das memórias do jornalista Sebastião Nery.

Interligne 18g

Nota deste blogueiro:
Getúlio demonstrou tino político. Antônio Lomanto Jr. (1924), homem político baiano, foi vereador, prefeito, deputado estadual, deputado federal, senador e governador de seu Estado.

Dê-me sua opinião. Evite palavras ofensivas. A melhor maneira de mostrar desprezo é calar-se e virar a página.