Renato Castanhari Jr. (*)
Kaká de Xangô estava em casa quando o telefone tocou. Sem saber que o celular de quem ligava estava grampeado, atendeu prontamente e aquela voz rouca familiar foi logo se apresentando.
– Alo, Kaká?
– Ô, se não é o meu ilustre 51!
– Fala, meu querido Mogbá.
– Mogbá! Não esqueceu! Falamos de ministro para ministro?
– Que nada, só você é ministro aqui, de Xangô, aqueles p(*) não me deixaram assumir, mas eles não perdem por esperar, esses merdas…
– Calma, Excelência, confia na Providência divina.
– Kaká, a Providência divina funciona, mas se a gente não ajudar com uns por fora, a coisa empaca. E é por isso que estou te ligando.
– Fala, meu amigo, o que está pegando.
– O Moro tá pegando, meu querido, esse filho da (*), p(*) do ca(*)… Mas vamos lá. Estava precisando que você jogasse as conchinhas aí porque a coisa tá brava, os caras querem a minha cabeça.
– Me fala exatamente a sua pergunta para eu perguntar pros búzios.
– Ahhhh, tem várias… Deixa ver… A minha amiga, cai ou não?
(Pausa onde se ouve os búzios caírem na esteira)
– Meu amigo… olha… tá difícil. Aqui fala que… ihhh… tá danada. E olha… o vice também cai fora. Aliás, deixa ver… vixi!…
– Pu(*), filhos(*)… Nós temos uma Suprema Corte totalmente acovardada, um Superior Tribunal de Justiça totalmente acovardado, um Parlamento totalmente acovardado…
– Excelência, Excelência, calma! Já falou isso em algum lugar. A sua amiga não tem jeito, é questão de semanas. Vamos ver o amigo. Qual a pergunta?
– Humm… companheiro… vê se não tem jeito, se um ebó resolve. Afinal, já dei muito pro santo, ca(*).
– Meu amigo, tem milagre que santo não faz. O Severino se deu mal, o Eduardo ganhou a eleição… quando dá, dá. Deixa eu consultar.
(Pausa e novamente apenas o som dos búzios pipocando na esteira)
– Excelência, não é por nada não, mas tá feia a coisa mesmo. E uma fugidinha pelo aeroporto? Pode ser uma saída.
– Esse é o plano C, meu querido, mas antes tenho que tentar tudo pra salvar este país!
– Que coração magnânimo! Vamos de ebó então. Vamos precisar de sangue de aridan, pó de pemba, mais dois cabritos, duas cabras, 16 frangos, duas galinhas da Guiné, um galo e um casal de pombos.
– Mas isso é um banquete pro santo, companheiro!
– Eles merecem, 51, eles merecem. Vou pedir para se ela e você forem inocentes, que continuem no comando do barco e que tudo fique bem.
– Caceta, ô Pai Kaká, você não entendeu nada? Se for inocente, o Supremo resolve, não precisa de ebó, ca(*)!
(*) Renato Castanhari Jr é publicitário e escritor. Edita o blogue Ladeira da Memória.